quarta-feira, 11 de março de 2020


Croton glandulosus e a matemática:
Decifrações geniais da Natureza!
Por Lucia Maria Paleari e Helenice de Oliveira Florentino





Olhares sobre o mundo

Parece que os matemáticos e aqueles que dominam essa área veem o mundo de maneira peculiar. Alguns deles dizem que o mundo é constituído de linhas, formas, composições, métricas e comportamentos, que se traduzem em números e equações, que explicam a razão de praticamente tudo ser como é.
Graças à inventividade humana, os números e equações, especialmente em áreas avançadas da ciência, podem até mesmo levar a prever o que ainda não foi constatado, mas que, demonstrado teoricamente por meio de cálculos, serve como desafio a novas investigações. Portanto, a matemática é uma ferramenta poderosa e importante, que o ser humano inventou e que o ajuda a avançar na construção do conhecimento em diversas áreas.
Infelizmente, a maioria das pessoas não aprendeu a usar bem os números desde a infância e a entender essa linguagem, que quase sempre ficou restrita à memorização de fórmulas e resolução de listas de exercícios com regras e caminhos seguidos automaticamente, sem compreensão, por alunos em formação. Pouca ou nenhuma atenção costuma ser dada ao ensino de como surgiram os números, os cálculos e qual o significado de resultados obtidos com as operações matemáticas. Talvez por isso, a ojeriza de muitas pessoas às aulas de matemática e a todas as demais que dela dependam, como a física e a química. É possível que se explique dessa forma também, a opção que muitos alunos candidatos a uma vaga de estudos em universidades fazem no vestibular, que é um exame obrigatório para isso. Muitos candidatos, nesse momento, optam por áreas como as biológicas e humanas, acreditando que assim ficarão “livres” dos números, dos cálculos. Mas, há um grande engano nesse pensar, especialmente com relação às ciências biológicas, que têm muito de físico-química e matemática, da digestão à pressão arterial, da força muscular à resistência esquelética, da produção de energia aos impulsos nervosos, da visão à fotossíntese, do DNA às modelagens matemáticas em estudos populacionais. E o que dizer dos saltos fantásticos dos gafanhotos, da estrutura e resistência das teias de aranha e das peculiaridades da bioluminescência!

Uma bela ilustração

Veja só o favo e a abelha europeia. A abelha não fez matemática, não aprendeu sobre formas e nem o significado de ângulos, mas como hábil engenheira, projeta sua moradia e armazém de mel, de tal forma, como se pode ver na próxima imagem, que os matemáticos demonstraram ser essa a estrutura mais econômica e de maior volume útil, que esse inseto poderia ter produzido.


Isso, porque cada alvéolo do favo (A), que compõe a colmeia, tem formato de um prisma (B), cuja área da base é um polígono hexagonal. Devido à forma regular desse prisma, os alvéolos se ajustam perfeitamente entre si por todos os seis lados, não sobrando espaços inúteis entre eles. Desta maneira, a parede de um alvéolo pode ser construída de forma a servir também como parede do alvéolo vizinho, implicando na necessidade de mínima quantidade de cera para construção da colmeia. Outra observação muito interessante é que os prismas regulares com bases triangular e quadrada também permitem este encaixe perfeito, mas quando comparados os polígonos regulares de mesmo perímetro nas formas hexagonal, triangular e quadrada, o hexágono é o que tem maior área e consequentemente o prisma hexagonal é o que apresenta maior volume quando comparado aos prismas triangular e quadrado, ou seja, com a mesma quantidade de cera, pode ser construído um alvéolo de maior volume, podendo armazenar uma maior quantidade de mel. Neste contexto, a estrutura do alvéolo na forma de prisma hexagonal é a mais econômica e de maior volume útil. Portanto, essa é uma estrutura especialmente proveitosa para as abelhas. 
Sendo assim, dá para entender quando um matemático diz que a matemática está em tudo. Porém, na verdade, trata-se de uma invenção humana, que levou a uma maneira muito especial e eficiente de traduzir o mundo, explicar certas coisas que existem, além de ser excelente ferramenta para a construção de edifícios, equipamentos de precisão etc.


Arquitetura de viver
(parafraseando Tom Jobim)

Por curiosidade e sagacidade foi impossível não atentar para diversos aspectos de Croton glandulosus, durante as investigações sobre seu fitófago policromático  Agonosoma flavolineatum. Das incontáveis e pequenas inflorescências, com as florzinhas masculinas, esbranquiçadas e produtoras de néctar, concentradas na parte externa da copa (imagem a seguir), até o número e arranjo dos delicados ramos, nada parecia ser inconstante.


Pensando na grande quantidade de pequenos insetos e aranhas visitantes, que buscam e consomem o néctar, parece ser estratégico concentrar as pequenas flores masculinas na camada mais externa da copa, local mais visível e acessível. Isso porque inimigos naturais de fitófagos, que causam prejuízo a C. glandulosus, poderiam protegê-la, ainda que não houvesse entre essas espécies uma relação planta-polinizador de grande peso — ao que tudo indica, quando as flores masculinas se abrem em uma inflorescência, as flores femininas dessa mesma inflorescência já teriam sido polinizadas. Por atrair tantos insetos, dentre eles muitas espécies de pequenas vespas, abelhas e moscas, vislumbramos a possibilidade dessa planta ser utilizada em práticas de controle biológico em lavouras.  Croton glandulosus manteria abrigadas e alimentadas as espécies úteis (ex. parasitoides e predadores), além dos polinizadores das plantas cultivadas. É claro, que depois de estudos para avaliar se essa euforbiácea não serve também de hospedeira a espécies que se desejaria controlar. E quanto mais seus visitantes de nectários florais e extraflorais eram conhecidos, mais nos convencíamos do seu potencial para o manejo de fitófagos indesejados, bem como para a alimentação de muitas espécies de abelhas, que são polinizadores importantíssimos de muitas plantas responsáveis pela maioria dos nossos alimentos, como as frutas doces e as vagens, que são também tipos de frutos.


Por outro lado, quanto ao número e arranjo dos delicados ramos que Croton glandulosus, algo especial acontece.
Após a germinação da semente, a plântula cresce como se vê na próxima figura (A-B), atingindo, em geral, uns 20 cm, quando surge no ápice do pequeno e delicado tronco, uma inflorescência, que dará origem a 1 fruto (B - fr) e aos primeiros ramos (B - a, b, c). 



Observe agora, na próxima imagem, um indivíduo adulto isolado de C. glandulosus.  Note que nele o arranjo dos primeiros ramos (a-b-c), que surgiram no ápice do pequeno tronco (t), repete-se no restante da planta. Com isso, surgem níveis de crescimento (ex. n1, n 2, n 3), como se fossem os andares de um edifício, com as inúmeras inflorescências concentradas na copa (setas i). Quando os frutos de um nível se formam, o próximo nível de ramificação se estabelece com novas inflorescências nos ápices dos ramos, o que faz com que as flores fiquem novamente concentradas na copa da planta.



Podemos, portanto, dada essa regularidade, dizer que há um valor-padrão, isto é, há uma razão constante nesse crescimento de C. glandulosus, que é igual a 3, porque se repete não só nesse, mas nos demais indivíduos dessa espécie. Por isso, e porque os 3 ramos abrem-se um pouco para os lados, todo indivíduo dessa espécie apresenta a copa repleta de ramos entrelaçados. Tantos ramos que se nos atrevermos a contar o número daqueles que se encontram no último nível de ramificação, certamente ficaremos cansados de tal tarefa, com grande chance de nos confundirmos e de não chegarmos a um resultado aceitável.
Será, então, impossível saber quantos ramos há nos níveis mais elevados da planta, onde se concentram flores, frutos e centenas de artrópodos visitantes?
Em resposta a essa pergunta, matemático que é matemático certamente dirá e com ênfase:
É claro que não! Podemos, sim, saber quantos ramos há nos níveis mais elevados de Croton glandulosus, sem ter que contá-los um a um.

Matemáticos ou não,
uma singela brincadeira

Comecemos de uma maneira empírica, recorrendo às observações já realizadas anteriormente e reforçando-as por meio da próxima imagem, que foi ampliada. Atente para os primeiros níveis de crescimento de um indivíduo relativamente pequeno de Croton glandulosus: n0, que corresponde ao tronco, depois para o primeiro nível de ramificação n1 e para o segundo nível de ramificação n2, neste caso, o último atingido pela planta até o momento em que ela foi fotografada. Observe que na extremidade dos ramos deste nível é que estão as respectivas inflorescências, com as últimas flores masculinas abertas (fm) e algumas primícias dos frutos (fr) na base.


Agora, conte quantos ramos existem em cada um desses níveis, e confira se os respectivos totais correspondem ao que está registrado a seguir.


Antes de seguir com a leitura e com base no que já foi feito, procure definir o número de ramos que deverá surgir no nível 3 (n3) e registre para checar seu achado mais tarde. Se necessário, observe novamente a imagem anterior.
Portanto, detectamos empiricamente a regularidade na produção de ramos nos diferentes níveis de crescimento da planta, que neste caso é igual a 3 e foi denominada de razão (r).
Mas, será que existe algo em comum entre essa regularidade e o total de ramos em cada nível? 
Parece que há, sim. 
Veja os valores totais já encontrados visualmente: 1, 3 e 9 ramos. Verifique que o número de ramos no nível 2 (n2 = 9) é 3 vezes o valor do nível anterior (n1 = 3), isto é, n1x3. Por sua vez, o nível 1 (n1 = 3), é também 3 vezes o valor do nível anterior (n0 =1), ou n0 x 3.
Podemos dizer então, que o número de ramos de cada nível é igual ao número de ramos do nível anterior multiplicado por 3, que é a razão (r).  Isso seria o mesmo que escrever assim:



Substituindo-se essas representações pelos seus respectivos valores teremos:



Diria aquele aluno atento: Que massa!
Então, isso quer dizer que no nível 3 haveria 27 ramos, como eu havia imaginado lá no início!

Mas, por estar atento, também observaria:

Mas se para saber o número de ramos de um nível é preciso conhecer o total de ramos do nível anterior, como é que será possível calcular o número de ramos do último nível daquela planta, se não se sabe quantos ramos há no nível anterior, sem antes contá-los?

Muito bem observado. E é aí que o matemático vai gostando mais da brincadeira, porque há incógnitas a serem descobertas e formas de enxergar os números, que permitem construir equações generalizadas, que nos ajudarão a descobrir valores de quaisquer níveis, sem ter de recorrer à contagem de ramos diretamente nas plantas. Vejamos então, como seria possível encontrar esses valores, fazendo apenas algumas operações matemáticas, isto é, uma série de procedimentos organizados, com alguns cálculos simples, para obter resultados desejados.
Repare que os resultados obtidos anteriormente indicaram os seguintes totais de ramos nos respectivos níveis de ramificação:



Sabemos também que todos esses resultados foram obtidos com base em um valor, que é a razão 3. Essa razão, que se repete a cada nível, com cada ramo que nele existir, é o mesmo que aconteceu no tronco (t), quando surgiu o primeiro nível (n1) com os 3 primeiros ramos, que foi representado como n1 = (n0 x r). Por isso, é como se n0 x r estivesse presente em cada nível de ramificação, o que permite que as equações anteriores sejam escritas de outra forma, como se mostra a seguir, após as setas:

Veja como o núcleo n0 x r se repete em cada nível e, em seguida, como os resultados, que indicam os totais de ramos de cada nível podem ser escritos de maneira semelhante, porque todos eles podem ser obtidos pela multiplicação de um mesmo número, que é o 3 (3x1 = 3 ou 31; 3x3=9 ou 32; 3x3x3 = 27 ou 33 e 3x3x3x3 = 81 ou 34). Este procedimento que é conhecido por potenciação ou exponenciação, significa que o número da base, no caso o 3, será multiplicado tantas vezes por ele mesmo, quantas forem indicadas pelo seu expoente, que é o número sobrescrito à direita da base.
Usando o nível 4 anterior, como exemplo, escreveremos três à quarta potência, cuja representação matemática, portanto, é: 34.
Nesse exemplo, a base é o número 3 e o expoente é o número 4 sobrescrito.
Como a equação de cada nível é construída seguindo o mesmo procedimento, que leva em conta o núcleo básico (n0 x r) multiplicado por mais tantas razões quantos forem os níveis considerados (n0; n1, n2 etc.), é possível escrever uma equação geral, mas de mesmo significado, que represente todas as demais. Então, ao invés de usarmos um nível específico, usaremos um nível genérico, que poderemos representar por nk. Em seguida, vem o núcleo comum, que nada mais é do que o nível 1 (n1), multiplicado pela razão, tantas vezes quantos forem os níveis até aquele que está sendo considerado, que neste caso genérico é k, menos a razão (r) já representada em n1 x (rk-1). Sendo assim, a equação geral, que substitui todas as demais pode ser escrita da seguinte forma:



Digamos, então, que queremos saber quantos ramos deve haver no nível 4 dessa planta. Para isso teremos de proceder como indicado na sequência a seguir.


Em seguida, basta fazer as devidas substituições na equação generalizada, da seguinte maneira:


Portanto, no nível 4 deve haver 81 ramos, valor que confere com o que foi encontrado anteriormente por meio da equação específica para esse nível de ramificação da planta.

Tal resultado mostra a quantidade fantástica de número de ramos, que C. glandulosus produz em apenas quatro níveis. Na sequência, as quantidades de ramos, por nível de ramificação de Croton glandulosus, são 3, 9, 27, 81 e 243. Atente para o fato de que os aumentos, de um nível para outro, ocorreram aos saltos e com base no total do nível anterior multiplicado pela razão 3. Esse tipo de aumento foi o que os matemáticos denominaram de Progressão Geométrica (PG) e nk é chamado de termo geral da PG.

Previsibilidade
e realidade produtiva

Conforme os cálculos feitos anteriormente, no nível 5 de C. glandulosus, deveria haver 243 ramos. Esse é o valor teórico, o que quer dizer, valor previsível em condições ideais, quando tudo está controlado. Mas sabemos que planta não é como a matemática, um sistema exato em que 3 x 81 é igual a 243. Trata-se de um sistema com incertezas e muito complexo a ser tratado. Um sistema como esse possui muitos componentes integrados e sujeitos a muitas interferências de variáveis do ambiente externo (ex. biológicas, geológicas, climáticas) e mudanças de variáveis do ambiente interno do indivíduo (ex. metabólicas, psicológicas). Muitas das vezes essas interferências e mudanças têm caráter aleatório.
Vejamos, então, como pequenas alterações podem provocar grandes e imprevisíveis acontecimentos. Imagine que quando um ramo de C. glandulosus produz a sua inflorescência na extremidade, que dará origem a 3 novos ramos, receba uma visita inesperada, que faça o que se vê na imagem a seguir.



Pois é, essa formiga saúva, carregando uma inflorescência de C. glandulosus, atesta quão imprevisível é a Natureza. A formiga buscava alimento para o fungo do seu formigueiro, do qual ela alimenta-se, e acabou coletando justamente a inflorescência de um determinado indivíduo de Croton glandulosus. Dessa forma, ela foi responsável pelo aborto de 3 ramos que surgiriam ali, quer dizer, a formiga impediu-os de se desenvolver e, com ele, de se desenvolverem flores, frutos e sementes, que privaram diversas espécies de seus recursos alimentares.
Digamos que o próximo nível de ramificação fosse o quarto. Teoricamente, de acordo com os cálculos já realizados anteriormente, haveria nesse nível um total de 81 ramos. Porém, na realidade, faltariam no nível 4 os 3 ramos que deixaram de crescer por causa da formiga, que cortou e carregou a inflorescência para o formigueiro.
Mas, e se houvesse um quinto nível de ramificação, quantos ramos no total, a saúva teria sido responsável por impedir que surgissem na planta?
Além dos 3 que deixaram de existir no nível 4, deixariam de existir mais 9, que corresponderiam aos que deveriam surgir daqueles que foram perdidos no nível 4, isto é, 3 novos ramos em cada um dos 3 ramos perdidos no nível 4.
Além de acontecimento imprevisível como esse em que a formiga cortou uma inflorescência, pode haver fatos que, embora pouco comuns, afetarão valores teóricos obtidos por meio de cálculos. Um deles é quando a planta, por alguma razão ainda desconhecida, emite 4 ramos em uma determinada ramificação, ou 2 ramos (a-b), como se pode ver a seguir, ao invés do padrão (3 ramos/ramificação), embora mantenha a produção de frutos tardios (t) e de primícias (p).






Quantos frutos e sementes,
um pé de Croton glandulosus pode produzir?

Na prática, para nós pode até não ser muito importante saber quantos frutos e semente são produzidos em um pé de C. glandulosus, porque não costumamos usar esses produtos, seja na nossa alimentação ou para produzirmos algo que nos seja útil, por exemplo. Mas imagine para a planta C. glandulosus e para o gorgulho Coelocephalapion sp, o que significa dispor de 3 ou de 1000 sementes. Representa poder deixar menos ou mais descendentes e, dessa forma, fazer crescer pouco ou muito as suas respectivas populações, além de influenciar todos os seres vivos que de alguma forma, direta ou indireta, necessitem deles. Por exemplo: Menos pés de Croton glandulosus crescendo e florescendo, significa menos néctar para abelhinhas sem ferrão e consequentemente menor produção de mel, menos sementes para os predadores de sementes como Coelocephalapion sp e, consequentemente para seus inimigos naturais, como Semiotellus sp., uma vespinha parasitoide de larvas desse gorgulho etc.
Independentemente de tudo isso, há outras regularidades interessantes em C. glandulosus, ligadas a frutos e sementes, que vale conferir. No tronco, nível (n0) de ramificação, a única inflorescência, produzida no seu ápice, gera apenas um fruto, que por sua vez tem, em geral, 3 sementes.  Nos demais níveis (n1, n2, n3 etc.) cada ramo também produz uma inflorescência, porém, cada uma delas originará primícias de 4 a 6 frutos, cada qual com 3 sementes. Quando esses frutos estiverem bem crescidos, em geral prestes a dispersar as sementes, 3 novos ramos do novo nível já estarão bem desenvolvidos e com uma nova inflorescência em cada um deles. Quando isso acontece, os nectários florais (flores masculinas) e os do ápice do pecíolo dos ramos mais velhos estarão senescentes, portanto, sem produzir néctar, que passará a ser secretado pelos nectários florais e extraflorais concentrados nas extremidades dos novos ramos. Portanto, a produção de néctar, concentrar-se-á na copa. No nível imediatamente abaixo, depois da explosão balística dos frutos dispersando as sementes surge, muitas vezes, 1 fruto tardio, mais raramente 2 deles. Estes frutos tardios, quase sempre crescem e amadurecem ao mesmo tempo em que os frutos das primícias do nível seguinte (mais jovem), mas possuem apenas 1 e mais raramente 2 sementes.
Como exercício, podemos considerar a quantidade mais comum de frutos das primícias e tardios do ramo anterior, que são 4 e 1, respectivamente. Sendo assim, quantos frutos haverá no nível 4 de um indivíduo de C. glandulosus?
Se n4 possui 81ramos, e cada ramo produz 4 primícias, então teremos 324 frutos nesse nível de ramificação, que correspondem a 81 x 4. Se em cada ramo for produzido um fruto tardio, o total de frutos produzidos nesse nível será de 324 + 81, o que dará um total de 405 frutos.
Considerando agora, que cada fruto tem 3 sementes, nesse nível de ramificação serão produzidas 972 sementes, que correspondem a  324 x 3. Se houver a produção de 81 frutos tardios com 1 semente cada, teremos um total de 972 + 81 sementes, dando um total de 1053 sementes nesse nível n4.
Supondo que essa planta não cresça mais, portanto, não emita mais nenhum nível de ramificação, poderemos calcular quantos frutos e sementes ela produziu durante a sua vida. Para isso, basta calcular, como foi feito para o nível 4, o número de frutos e sementes produzidos nos níveis anteriores (n0, n1, n2, n3) e somar os totais parciais do n0 ao n4. Não esquecer que em n0 só é produzido um fruto.
Na tabela a seguir estão os resultados que foram calculados: totais parciais nas linhas (somatório de cada nível de ramificação) e totais gerais nas colunas (somatório de tudo o que foi produzido pela planta durante o seu ciclo). 



Podemos dizer, considerando a tabela anterior, que uma planta de C. glandulosus, que atinja quatro níveis de ramificação, produzirá durante todo o seu tempo de vida até atingir essa fase do crescimento, em condições ideais, o total de 601 frutos, dos quais 120 serão tardios, e 1563 sementes, das quais 120 serão tardias. Porém, predação de inflorescências, por exemplo, pode reduzir o número de ramos naquele nível; flores femininas podem não ser polinizadas, o que fará com que elas não gerem frutos; frutos jovens podem ser consumidos por gafanhotos, portanto também deixarão de existir. Isso tudo, sem contar que pode haver mais do que 4 primícias, bem como haver mais de um ou não haver nenhum fruto tardio por ramo. Portanto um sistema altamente complexo.
Apesar dessas interferências imprevisíveis do ambiente, que impossibilitam afirmar com 100% de certeza que as previsões sobre a produção de ramos, frutos e sementes acontecerão conforme o esperado, os padrões apresentados por C. glandulosus servem para conseguirmos, a partir dos cálculos apropriados, termos uma boa noção do valor máximo possível de produção e até mesmo avaliar as perdas em dada localidade. Para isso, precisaríamos considerar, depois de investigações e estudos, a relação entre o valor teórico e os valores que normalmente se registram no campo. Enfim, depois disso, será possível saber, aproximadamente, quantas sementes serão produzidas em determinado momento do crescimento da planta e também durante toda a sua vida, em um determinado local. E melhor ainda, sem ter que fazer contagens diretas a cada vez que se quiser saber qual a produção total de certo número de plantas, quanto a frutos, sementes ou ramos.
Não bastasse isso tudo que nos proporciona o uso adequado dos cálculos numéricos, ajustados ao sistema que se está estudando, os matemáticos foram além. Eles encontraram um jeito de resolver problemas com presença de incertezas, como aconteceu com aquele ramo de Croton glandulosus, que deixou de produzir os frutos previstos, porque uma formiga inesperadamente o cortou e levou para seu ninho.  Em situações imprevisíveis como essa (presença de incertezas) os matemáticos aumentam as chances de determinar soluções muito próximas da solução real (estimativas) ou encontrando um pequeno intervalo numérico e garantindo que a solução real está dentro dele. Essas estimativas e intervalos podem ser encontrados utilizando procedimentos matemáticos mais avançados, os quais necessitam de estudos aprofundados de técnicas estatísticas (probabilidades), computação numérica, Lógica Fuzzy (Lógica Difusa), modelagem matemática etc. O que é preciso enfatizar é que a base de todos esses estudos é a Matemática ensinada no ensino fundamental e médio. Sem ela, não é possível obter nenhum outro conhecimento mais aprofundado, de fundo quantitativo. E mais, a matemática que se ensina no nível fundamental e no nível médio é a base não só da Matemática avançada, mas também da Física, Química, Engenharia, Computação, Economia, Ecologia e diversas outras áreas.

Para saber mais





Lucia Maria Paleari
lmpaleari@gmail.com

Helenice de Oliveira Florentino Silva
helenice.silva@unesp.br