Olhares
sobre o mundo
Parece que os matemáticos e aqueles que dominam essa
área veem o mundo de maneira peculiar. Alguns deles dizem que o mundo é constituído
de linhas, formas, composições, métricas e comportamentos, que se traduzem em
números e equações, que explicam a razão de praticamente tudo ser como é.
Graças à inventividade humana, os números e equações, especialmente
em áreas avançadas da ciência, podem até mesmo levar a prever o que ainda não
foi constatado, mas que, demonstrado teoricamente por meio de cálculos, serve como
desafio a novas investigações. Portanto, a matemática é uma ferramenta poderosa
e importante, que o ser humano inventou e que o ajuda a avançar na construção
do conhecimento em diversas áreas.
Infelizmente, a maioria das pessoas não aprendeu a
usar bem os números desde a infância e a entender essa linguagem, que quase
sempre ficou restrita à memorização de fórmulas e resolução de listas de
exercícios com regras e caminhos seguidos automaticamente, sem compreensão, por
alunos em formação. Pouca ou nenhuma atenção costuma ser dada ao ensino de como
surgiram os números, os cálculos e qual o significado de resultados obtidos com
as operações matemáticas. Talvez por isso, a ojeriza de muitas pessoas às aulas
de matemática e a todas as demais que dela dependam, como a física e a química.
É possível que se explique dessa forma também, a opção que muitos alunos
candidatos a uma vaga de estudos em universidades fazem no vestibular, que é um
exame obrigatório para isso. Muitos candidatos, nesse momento, optam por áreas
como as biológicas e humanas, acreditando que assim ficarão “livres” dos números,
dos cálculos. Mas, há um grande engano nesse pensar, especialmente com relação
às ciências biológicas, que têm muito de físico-química e matemática, da
digestão à pressão arterial, da força muscular à resistência esquelética, da produção
de energia aos impulsos nervosos, da visão à fotossíntese, do DNA às modelagens matemáticas em estudos populacionais. E o que dizer dos saltos
fantásticos dos gafanhotos, da estrutura e resistência das teias de aranha e das
peculiaridades da bioluminescência!
Uma
bela ilustração
Veja só o favo e a abelha europeia. A abelha não fez
matemática, não aprendeu sobre formas e nem o significado de ângulos, mas como
hábil engenheira, projeta sua moradia e armazém de mel, de tal forma, como se
pode ver na próxima imagem, que os matemáticos demonstraram ser essa a
estrutura mais econômica e de maior volume útil, que esse inseto poderia ter
produzido.
Isso, porque cada alvéolo do favo (A),
que compõe a colmeia, tem formato de um prisma (B), cuja área da base é um polígono hexagonal. Devido
à forma regular desse prisma, os alvéolos se ajustam perfeitamente entre si por
todos os seis lados, não sobrando espaços inúteis entre eles. Desta maneira, a
parede de um alvéolo pode ser construída de forma a servir também como parede
do alvéolo vizinho, implicando na necessidade de mínima quantidade de cera para
construção da colmeia. Outra observação muito interessante é que os prismas
regulares com bases triangular e quadrada também permitem este encaixe
perfeito, mas quando comparados os polígonos regulares de mesmo perímetro nas
formas hexagonal, triangular e quadrada, o hexágono é o que tem maior área e
consequentemente o prisma hexagonal é o que apresenta maior volume quando
comparado aos prismas triangular e quadrado, ou seja, com a mesma quantidade de
cera, pode ser construído um alvéolo de maior volume, podendo armazenar uma
maior quantidade de mel. Neste contexto, a estrutura do alvéolo na forma de
prisma hexagonal é a mais econômica e de maior volume útil. Portanto, essa é
uma estrutura especialmente proveitosa para as abelhas.
Sendo assim, dá para entender quando um
matemático diz que a matemática está em tudo. Porém, na verdade, trata-se de
uma invenção humana, que levou a uma maneira muito especial e eficiente de
traduzir o mundo, explicar certas coisas que existem, além de ser excelente
ferramenta para a construção de edifícios, equipamentos de precisão etc.
Arquitetura
de viver
Por curiosidade e sagacidade foi impossível não
atentar para diversos aspectos de Croton
glandulosus, durante as investigações sobre seu fitófago policromático Agonosoma flavolineatum.
Das incontáveis e pequenas inflorescências, com as florzinhas masculinas, esbranquiçadas
e produtoras de néctar, concentradas na parte externa da copa (imagem a seguir),
até o número e arranjo dos delicados ramos, nada parecia ser inconstante.
Pensando na grande quantidade de pequenos insetos e
aranhas visitantes, que buscam e consomem o néctar, parece ser estratégico concentrar
as pequenas flores masculinas na camada mais externa da copa, local mais
visível e acessível. Isso porque inimigos naturais de fitófagos, que causam
prejuízo a C. glandulosus, poderiam
protegê-la, ainda que não houvesse entre essas espécies uma relação
planta-polinizador de grande peso — ao que tudo indica, quando as flores
masculinas se abrem em uma inflorescência, as flores femininas dessa mesma
inflorescência já teriam sido polinizadas. Por atrair tantos insetos, dentre
eles muitas espécies de pequenas vespas, abelhas e moscas, vislumbramos a
possibilidade dessa planta ser utilizada em práticas de controle biológico em lavouras. Croton glandulosus manteria abrigadas e
alimentadas as espécies úteis (ex. parasitoides e predadores), além dos
polinizadores das plantas cultivadas. É claro, que depois de estudos para avaliar se essa
euforbiácea não serve também de hospedeira
a espécies que se desejaria controlar. E quanto mais seus visitantes de nectários florais e
extraflorais eram conhecidos, mais nos convencíamos do seu potencial para o
manejo de fitófagos indesejados, bem como para a alimentação de muitas espécies
de abelhas, que são polinizadores importantíssimos de muitas plantas
responsáveis pela maioria dos nossos alimentos, como as frutas doces e as
vagens, que são também tipos de frutos.
Por outro lado, quanto ao número e arranjo dos
delicados ramos que Croton glandulosus, algo especial acontece.
Após a germinação da semente, a plântula
cresce como se vê na próxima figura (A-B), atingindo, em geral, uns 20 cm,
quando surge no ápice do pequeno e delicado tronco, uma inflorescência, que
dará origem a 1 fruto (B - fr) e aos primeiros ramos (B - a, b, c).
Observe agora, na próxima imagem, um indivíduo adulto
isolado de C. glandulosus. Note que nele o arranjo dos primeiros ramos
(a-b-c), que surgiram no ápice do pequeno tronco (t), repete-se no restante da
planta. Com isso, surgem níveis de crescimento (ex. n1, n 2, n 3), como se fossem os andares de um edifício, com as
inúmeras inflorescências concentradas na copa (setas i). Quando os frutos de um
nível se formam, o próximo nível de ramificação se estabelece com novas
inflorescências nos ápices dos ramos, o que faz com que as flores fiquem
novamente concentradas na copa da planta.
Podemos, portanto, dada essa regularidade, dizer que há
um valor-padrão, isto é, há uma razão constante nesse crescimento de C. glandulosus, que é igual a 3, porque
se repete não só nesse, mas nos demais indivíduos dessa espécie. Por isso, e
porque os 3 ramos abrem-se um pouco para os lados, todo indivíduo dessa espécie
apresenta a copa repleta de ramos entrelaçados. Tantos ramos que se nos
atrevermos a contar o número daqueles que se encontram no último nível de
ramificação, certamente ficaremos cansados de tal tarefa, com grande chance de
nos confundirmos e de não chegarmos a um resultado aceitável.
Será, então, impossível saber quantos ramos há nos
níveis mais elevados da planta, onde se concentram flores, frutos e centenas de
artrópodos visitantes?
Em resposta a essa pergunta, matemático que é
matemático certamente dirá e com ênfase:
É claro que não! Podemos, sim, saber quantos ramos há
nos níveis mais elevados de Croton
glandulosus, sem ter que contá-los um a um.
Matemáticos
ou não,
uma
singela brincadeira
Comecemos de uma maneira empírica, recorrendo às
observações já realizadas anteriormente e reforçando-as por meio da próxima
imagem, que foi ampliada. Atente para os primeiros níveis de crescimento de um
indivíduo relativamente pequeno de Croton
glandulosus: n0, que corresponde ao tronco, depois para o primeiro
nível de ramificação n1 e para o segundo nível de ramificação n2, neste
caso, o último atingido pela planta até o momento em que ela foi fotografada.
Observe que na extremidade dos ramos deste nível é que estão as respectivas
inflorescências, com as últimas flores masculinas abertas (fm) e algumas
primícias dos frutos (fr) na base.
Agora, conte quantos ramos existem em cada um desses
níveis, e confira se os respectivos totais correspondem ao que está registrado
a seguir.
Antes de seguir com a leitura e com base no que já foi
feito, procure definir o número de ramos que deverá surgir no nível 3 (n3) e
registre para checar seu achado mais tarde. Se necessário, observe novamente a
imagem anterior.
Portanto, detectamos empiricamente a regularidade na produção
de ramos nos diferentes níveis de crescimento da planta, que neste caso é igual
a 3 e foi denominada de razão (r).
Mas, será que existe algo em comum entre essa
regularidade e o total de ramos em cada nível?
Parece que há, sim.
Veja os valores totais já encontrados visualmente: 1,
3 e 9 ramos. Verifique que o número de ramos no nível 2 (n2 = 9)
é 3 vezes o valor do nível anterior (n1 = 3), isto é, n1x3. Por sua vez, o nível 1 (n1 = 3), é também 3 vezes o valor do nível anterior (n0 =1),
ou n0 x 3.
Podemos dizer então, que o número de
ramos de cada nível é igual ao número de ramos do nível anterior multiplicado
por 3, que é a razão (r). Isso seria o
mesmo que escrever assim:
Substituindo-se essas representações pelos
seus respectivos valores teremos:
Diria aquele aluno atento: Que massa!
Então, isso quer dizer que no nível 3 haveria 27 ramos,
como eu havia imaginado lá no início!
Mas, por estar atento, também observaria:
Mas se para saber o número de ramos de um nível é
preciso conhecer o total de ramos do nível anterior, como é que será possível
calcular o número de ramos do último nível daquela planta, se não se sabe
quantos ramos há no nível anterior, sem antes contá-los?
Muito bem observado. E é aí que o matemático vai
gostando mais da brincadeira, porque há incógnitas a serem descobertas e formas
de enxergar os números, que permitem construir equações generalizadas, que nos
ajudarão a descobrir valores de quaisquer níveis, sem ter de recorrer à
contagem de ramos diretamente nas plantas. Vejamos então, como seria possível
encontrar esses valores, fazendo apenas algumas operações matemáticas, isto é, uma
série de procedimentos organizados, com alguns cálculos simples, para obter
resultados desejados.
Repare que os resultados obtidos anteriormente indicaram
os seguintes totais de ramos nos respectivos níveis de ramificação:
Sabemos também que todos esses resultados foram
obtidos com base em um valor, que é a razão 3. Essa razão, que se repete a cada
nível, com cada ramo que nele existir, é o mesmo que aconteceu no tronco (t), quando
surgiu o primeiro nível (n1) com os 3 primeiros ramos, que foi representado como n1 = (n0 x r).
Por isso, é como se n0 x r estivesse presente em cada nível de ramificação, o
que permite que as equações anteriores sejam escritas de outra forma, como se
mostra a seguir, após as setas:
Veja como o núcleo n0 x r se
repete em cada nível e, em seguida, como os resultados, que indicam os totais
de ramos de cada nível podem ser escritos de maneira semelhante, porque todos
eles podem ser obtidos pela multiplicação de um mesmo número, que é o 3 (3x1 = 3 ou 31; 3x3=9 ou 32; 3x3x3 = 27 ou 33 e
3x3x3x3
= 81 ou 34). Este procedimento que é conhecido por potenciação
ou exponenciação, significa que o número da base, no caso o 3, será
multiplicado tantas vezes por ele mesmo, quantas forem indicadas pelo seu
expoente, que é o número sobrescrito à direita da base.
Usando o nível 4 anterior, como exemplo,
escreveremos três à quarta potência, cuja representação matemática, portanto, é:
34.
Nesse exemplo, a base é o número 3 e o
expoente é o número 4 sobrescrito.
Como a equação de cada nível é
construída seguindo o mesmo procedimento, que leva em conta o núcleo básico (n0 x r)
multiplicado por mais tantas razões quantos forem os níveis considerados (n0; n1, n2
etc.), é possível escrever uma equação geral, mas de mesmo significado, que
represente todas as demais. Então, ao invés de usarmos um nível específico,
usaremos um nível genérico, que poderemos representar por nk. Em
seguida, vem o núcleo comum, que nada mais é do que o nível 1 (n1),
multiplicado pela razão, tantas vezes quantos forem os níveis até aquele que
está sendo considerado, que neste caso genérico é k, menos a razão (r) já representada em n1
x (rk-1). Sendo assim, a equação geral, que substitui todas
as demais pode ser escrita da seguinte forma:
Digamos, então, que queremos saber
quantos ramos deve haver no nível 4 dessa planta. Para isso teremos de proceder
como indicado na sequência a seguir.
Em seguida, basta fazer as devidas
substituições na equação generalizada, da seguinte maneira:
Portanto, no nível 4 deve haver 81
ramos, valor que confere com o que foi encontrado anteriormente por meio da
equação específica para esse nível de ramificação da planta.
Tal resultado mostra a quantidade
fantástica de número de ramos, que C.
glandulosus produz em apenas quatro níveis. Na sequência, as quantidades de
ramos, por nível de ramificação de Croton
glandulosus, são 3, 9, 27, 81 e 243. Atente para o fato de que os aumentos,
de um nível para outro, ocorreram aos saltos e com base no total do nível anterior
multiplicado pela razão 3. Esse tipo de aumento foi o que os matemáticos
denominaram de Progressão Geométrica (PG) e nk é chamado de termo geral da PG.
Previsibilidade
e realidade produtiva
Conforme os cálculos feitos anteriormente, no nível 5
de C. glandulosus, deveria haver 243
ramos. Esse é o valor teórico, o que quer dizer, valor previsível em condições
ideais, quando tudo está controlado. Mas sabemos que planta não é como a
matemática, um sistema exato em que 3 x 81 é igual a 243. Trata-se de um
sistema com incertezas e muito complexo a ser tratado. Um sistema como esse
possui muitos componentes integrados e sujeitos a muitas interferências de
variáveis do ambiente externo (ex. biológicas, geológicas, climáticas) e mudanças
de variáveis do ambiente interno do indivíduo (ex. metabólicas, psicológicas).
Muitas das vezes essas interferências e mudanças têm caráter aleatório.
Vejamos, então, como pequenas alterações podem
provocar grandes e imprevisíveis acontecimentos. Imagine que quando um ramo de C. glandulosus produz a sua
inflorescência na extremidade, que dará origem a 3 novos ramos, receba uma
visita inesperada, que faça o que se vê na imagem a seguir.
Pois é, essa formiga saúva, carregando uma
inflorescência de C. glandulosus,
atesta quão imprevisível é a Natureza. A formiga buscava alimento para o fungo
do seu formigueiro, do qual ela alimenta-se, e acabou coletando justamente a
inflorescência de um determinado indivíduo de Croton glandulosus. Dessa forma, ela foi responsável pelo aborto de
3 ramos que surgiriam ali, quer dizer, a formiga impediu-os de se desenvolver
e, com ele, de se desenvolverem flores, frutos e sementes, que privaram
diversas espécies de seus recursos alimentares.
Digamos que o próximo nível de ramificação fosse o
quarto. Teoricamente, de acordo com os cálculos já realizados anteriormente,
haveria nesse nível um total de 81 ramos. Porém, na realidade, faltariam no
nível 4 os 3 ramos que deixaram de crescer por causa da formiga, que cortou e
carregou a inflorescência para o formigueiro.
Mas, e se houvesse um quinto nível de ramificação,
quantos ramos no total, a saúva teria sido responsável por impedir que
surgissem na planta?
Além dos 3 que deixaram de existir no nível 4,
deixariam de existir mais 9, que corresponderiam aos que deveriam surgir
daqueles que foram perdidos no nível 4, isto é, 3 novos ramos em cada um dos 3
ramos perdidos no nível 4.
Além de acontecimento imprevisível como esse em
que a formiga cortou uma inflorescência, pode haver fatos que, embora pouco
comuns, afetarão valores teóricos obtidos por meio de cálculos. Um deles é
quando a planta, por alguma razão ainda desconhecida, emite 4 ramos em uma
determinada ramificação, ou 2 ramos (a-b), como se pode ver a seguir, ao invés
do padrão (3 ramos/ramificação), embora mantenha a produção de frutos tardios
(t) e de primícias (p).
Quantos
frutos e sementes,
um
pé de Croton glandulosus pode
produzir?
Na prática, para nós pode até não ser muito importante
saber quantos frutos e semente são produzidos em um pé de C. glandulosus, porque não costumamos usar esses produtos, seja na
nossa alimentação ou para produzirmos algo que nos seja útil, por exemplo. Mas
imagine para a planta C. glandulosus e
para o gorgulho Coelocephalapion sp, o que significa
dispor de 3 ou de 1000 sementes. Representa poder deixar menos ou mais
descendentes e, dessa forma, fazer crescer pouco ou muito as suas respectivas
populações, além de influenciar todos os seres vivos que de alguma forma,
direta ou indireta, necessitem deles. Por exemplo: Menos pés de Croton glandulosus crescendo e
florescendo, significa menos néctar para abelhinhas sem ferrão e
consequentemente menor produção de mel, menos sementes para os predadores de
sementes como Coelocephalapion sp e,
consequentemente para seus inimigos naturais, como Semiotellus sp., uma
vespinha parasitoide de larvas desse gorgulho etc.
Independentemente de tudo isso, há outras
regularidades interessantes em C.
glandulosus, ligadas a frutos e sementes, que vale conferir. No tronco, nível
(n0) de ramificação, a única inflorescência, produzida no seu ápice, gera apenas
um fruto, que por sua vez tem, em geral, 3 sementes. Nos demais níveis (n1, n2, n3
etc.) cada ramo também produz uma inflorescência, porém, cada uma delas
originará primícias de 4 a 6 frutos, cada qual com 3 sementes. Quando esses
frutos estiverem bem crescidos, em geral prestes a dispersar as sementes, 3
novos ramos do novo nível já estarão bem desenvolvidos e com uma nova
inflorescência em cada um deles. Quando isso acontece, os nectários florais
(flores masculinas) e os do ápice do pecíolo dos ramos mais velhos estarão
senescentes, portanto, sem produzir néctar, que passará a ser secretado pelos
nectários florais e extraflorais concentrados nas extremidades dos novos ramos.
Portanto, a produção de néctar, concentrar-se-á na copa. No nível imediatamente
abaixo, depois da explosão balística dos frutos dispersando as sementes surge,
muitas vezes, 1 fruto tardio, mais raramente 2 deles. Estes frutos tardios,
quase sempre crescem e amadurecem ao mesmo tempo em que os frutos das primícias
do nível seguinte (mais jovem), mas possuem apenas 1 e mais raramente 2
sementes.
Como exercício, podemos considerar a quantidade mais
comum de frutos das primícias e tardios do ramo anterior, que são 4 e 1,
respectivamente. Sendo assim, quantos frutos haverá no nível 4 de um indivíduo
de C. glandulosus?
Se n4 possui 81ramos, e cada ramo produz 4 primícias, então teremos 324 frutos
nesse nível de ramificação, que correspondem a 81
x 4. Se em cada ramo for produzido um
fruto tardio, o total de frutos produzidos nesse nível será de 324 + 81,
o que dará um total de 405 frutos.
Considerando agora, que cada fruto tem 3 sementes, nesse
nível de ramificação serão produzidas 972 sementes, que correspondem a 324 x 3. Se houver a produção de 81 frutos tardios com 1 semente cada, teremos um total
de 972 + 81 sementes, dando um total de 1053
sementes nesse nível n4.
Supondo que essa planta não cresça mais, portanto, não
emita mais nenhum nível de ramificação, poderemos calcular quantos frutos e
sementes ela produziu durante a sua vida. Para isso, basta calcular, como foi
feito para o nível 4, o número de frutos e sementes produzidos nos níveis
anteriores (n0, n1, n2, n3) e somar os totais parciais do n0 ao n4. Não
esquecer que em n0 só é produzido um fruto.
Na tabela a seguir estão os resultados que foram
calculados: totais parciais nas linhas (somatório de cada nível de ramificação)
e totais gerais nas colunas (somatório de tudo o que foi produzido pela planta
durante o seu ciclo).
Podemos dizer, considerando a tabela anterior, que uma
planta de C. glandulosus, que atinja quatro
níveis de ramificação, produzirá durante todo o seu tempo de vida até atingir
essa fase do crescimento, em condições ideais, o total de 601 frutos, dos quais
120 serão tardios, e 1563 sementes, das quais 120 serão tardias. Porém, predação
de inflorescências, por exemplo, pode reduzir o número de ramos naquele nível;
flores femininas podem não ser polinizadas, o que fará com que elas não gerem
frutos; frutos jovens podem ser consumidos por gafanhotos, portanto também
deixarão de existir. Isso tudo, sem contar que pode haver mais do que 4
primícias, bem como haver mais de um ou não haver nenhum fruto tardio por ramo.
Portanto um sistema altamente complexo.
Apesar dessas interferências imprevisíveis do ambiente,
que impossibilitam afirmar com 100% de certeza que as previsões sobre a
produção de ramos, frutos e sementes acontecerão conforme o esperado, os
padrões apresentados por C. glandulosus servem
para conseguirmos, a partir dos cálculos apropriados, termos uma boa noção do valor
máximo possível de produção e até mesmo avaliar as perdas em dada localidade. Para
isso, precisaríamos considerar, depois de investigações e estudos, a relação
entre o valor teórico e os valores que normalmente se registram no campo. Enfim,
depois disso, será possível saber, aproximadamente, quantas sementes serão produzidas
em determinado momento do crescimento da planta e também durante toda a sua
vida, em um determinado local. E melhor ainda, sem ter que fazer contagens diretas
a cada vez que se quiser saber qual a produção total de certo número de plantas,
quanto a frutos, sementes ou ramos.
Não bastasse isso tudo que nos proporciona o uso adequado
dos cálculos numéricos, ajustados ao sistema que se está estudando, os
matemáticos foram além. Eles encontraram um jeito de resolver problemas com
presença de incertezas, como aconteceu com aquele ramo de Croton glandulosus, que deixou de produzir os frutos previstos,
porque uma formiga inesperadamente o cortou e levou para seu ninho. Em situações imprevisíveis como essa
(presença de incertezas) os matemáticos aumentam as chances de determinar
soluções muito próximas da solução real (estimativas) ou encontrando um pequeno
intervalo numérico e garantindo que a solução real está dentro dele. Essas estimativas e intervalos podem ser encontrados
utilizando procedimentos matemáticos mais avançados, os quais necessitam de
estudos aprofundados de técnicas estatísticas (probabilidades), computação
numérica, Lógica Fuzzy (Lógica Difusa), modelagem matemática etc. O que é
preciso enfatizar é que a base de todos esses estudos é a Matemática ensinada
no ensino fundamental e médio. Sem ela, não é possível obter nenhum outro
conhecimento mais aprofundado, de fundo quantitativo. E mais, a matemática que
se ensina no nível fundamental e no nível médio é a base não só da Matemática avançada,
mas também da Física, Química, Engenharia, Computação, Economia, Ecologia e
diversas outras áreas.
Para saber mais
Lucia Maria Paleari
lmpaleari@gmail.com
Helenice de Oliveira Florentino Silva
helenice.silva@unesp.br