Por Lucia Maria Paleari
Croton glandulosus reúne uma entomofauna bastante diversificada, tanto no que diz respeito ao número de espécies, que são aqueles indivíduos capazes de se acasalar e de deixar descendentes também capazes de se reproduzir, quanto ao número de ordens de insetos, que são agrupamentos de indivíduos de diferentes espécies, mas que guardam certas características comuns que permitem diferenciá-los de outras ordens. Por exemplo, os besouros de diferentes espécies (ver figura 1) como o Apion sp., bicudinho que quando larva consome sementes de Croton sp., são agrupados na ordem Coleoptera. Apesar de possuírem diferenças, todos os coleópteros possuem certas características comuns, que permitem considerá-los e identifica-los como um grupo. Uma delas, bastante fácil de reconhecer, é o élitro. Este é o nome que foi dado às asas anteriores, que são relativamente duras e que cobrem o outro par de asas, estas membranosas e mais delicadas (figura 1A), que os besouros também possuem.
Figura 1 - Quatro espécies de insetos da ordem Coleoptera, grupo dos besouros, associadas a Croton glandulosus. No alto, à esquerda, indivíduo com as asas abertas evidenciando os élitros (par anterior) e as asas membranosas (par posterior); à direita Apion sp. e abaixo duas espécies ainda não identificadas por especialista, sendo o indivíduo da esquerda, um pouco maior do que 1,0 mm de comprimento.
Uma outra ordem associada a Croton glandulosus, com muitos representantes é a Hemiptera, indivíduos popularmente conhecidos como percevejos ou marias-fedidas (figura 2). As asas anteriores destes insetos, denominadas de hemiélitros, são diferentes das dos coleópteros. Elas têm uma parte mais coriácea (corium) e outra, na porção terminal, membranosa (membrana). Também é característica deste grupo possuir aparelho bucal sugador, ao passo que os besouros possuem mandíbulas, que são utilizadas para cortar alimentos.
Figura 2 – Representantes de espécies da ordem Hemíptera associadas a Croton glandulosus; na imagem superior esquerda as legendas indicam as partes que compõem as asas anteriores (corium e membrana) e o escutelo, estrutura característica dos hemípteros, que na família Scuteleridae é bem desenvolvido, como se pode ver na espécie Pachicoris torridus (imagem inferior do lado esquerdo), cujo escutelo recobre todo o abdome do inseto.
Alguns desses insetos adultos, das diferentes ordens, alimentam-se principalmente de animais, enquanto outros têm preferência por plantas. Mas, mesmo assim, é comum encontrar tanto os carnívoros como os herbívoros, fazendo uso do néctar que as flores masculinas de Croton glandulosus produzem nas glândulas localizadas na base interna das flores (figura 3) ou de produtos de outras estruturas glandulares, que são abundantes em Croton glandulosus. Uma das mais visitadas é a que se encontra no ápice dos pecíolos das folhas (estrutura onde se alimenta o besourinho da figura 1 – imagem inferior esquerda).
Figura 3 - Hypselonotus fulvus é o nome desse hemíptero sugador de frutos (imagem superior) de Croton glandulosus, mas que vez por outra toma um pouco de néctar (imagem inferior), substância rica em açucares.
Veja agora como acontece o desenvolvimento dos hemípteros, desenvolvimento que denominamos de metamorfose incompleta. Vou usar como exemplo, uma outra espécie que suga frutos de Croton glandulosus, o Agonosoma flavolineatum, que é policromático (poli=vários; cromático = cor). As fêmeas desta espécie possuem 3 padrões de cor e o macho apenas um, padrão este que tem um correspondente entre os 3 das fêmeas (ver figura 4).
Figura 4 – Representação do ciclo de vida de hemípteros (metamorfose incompleta = hemimetabolia), que passam pelas fases de ovo, ninfa e adultos.
As cigarrinhas também se desenvolvem dessa forma, mas os himenópteros (vespas, abelhas e formigas), coleópteros (besouros), os lepidópteros (mariposas e borboletas) e os dípteros (moscas) passam por um outro tipo de desenvolvimento denominado de metamorfose completa. Veja a figura 5.
Figura 5 – Representação da metamorfose completa (holometabolia), usando como exemplo os himenópteros, mas esse tipo de desenvolvimento acontece também com outros insetos, como as moscas e besouros.
Todos esses aspectos complexos da vida dos insetos ainda se somam ao fato de que nem sempre os indivíduos jovens de uma espécie consomem o mesmo tipo de alimento que os adultos. Veja a figura a seguir, que mostra a vespinha adulta da figura 5 alimentando-se de néctar produzido por Croton glandulosus. Essa mesma vespinha na fase de larva consumiu semente de Croton glandulosus.
Figura 6 - Vespinha adulta alimentando-se na glândula do ápice do pecíolo da folha de Croton glandulosus.
O besourinho Apion sp., que quando larva também se alimenta de semente dessa planta, na fase adulta utiliza-se de néctar. Diversos inimigos naturais de espécies que atacam plantações ou animais de criação, também podem utilizar alimentos diferentes quando se encontram na fase jovem e na fase adulta. Esse fato, somado a tantos outros que se referem ao desenvolvimento, aos hábitos de vida dos insetos, nos revela quão importantes e complexos devem ser os estudos voltados à biologia e ecologia dos inimigos naturais das espécies consideradas concorrentes do Homem, quando se trata de produzir alimento, seja ele de origem vegetal ou animal. Portanto, investir em controle biológico significa também investir em muito estudo, a fim de que possamos realizar ações eficazes para reduzir o tamanho de populações de espécies indesejáveis em culturas e criações de animais. Usar indiscriminadamente agrotóxicos não é apenas contaminar solos, mananciais de água e o próprio Homem, mas é matar antes de tudo, parasitóides e predadores. Estes, que são em geral muito eficientes na procura e ataque aos seus hospedeiros e presas, são também frágeis e sucumbirão até mesmo antes do que os indivíduos da espécie considerada “praga”.
Agradecimento especial: Quero agradecer à Drª Jocélia Grazia, grande conhecedora dos hemípteros e pessoa muito gentil, pela importante ajuda identificando as espécies dessa ordem de insetos, que encontramos associadas a Croton glandulosus. Agradeço também ao Dr. José Antonio Marin Fernandes pela identificação do Hypselonotus fulvus. Os sistematas, pesquisadores especialistas no estudo e classificação dos seres vivos, são fundamentais, porque sem identificar precisamente as espécies que são estudadas em qualquer área das Ciências Biológicas, todo o estudo deixa de ter significado.